segunda-feira, 27 de janeiro de 2025

Basu (2017)

BASU, Deepankar. Quantitative empirical research in Marxist political economy: a selective review. Journal of Economic Surveys, v. 31, n. 5, p. 1359–1386, 2017. DOI: 10.1111/joes.12218. Disponível em: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/joes.12218.


6. Análise de Rentabilidade

A economia política marxista entende o capitalismo como um sistema movido pela lógica da acumulação de capital. Como a taxa de lucro é um determinante fundamental da acumulação de capital, uma vasta literatura marxista se desenvolveu em torno da análise da rentabilidade, com pelo menos duas vertentes principais. A primeira vertente foca no que podemos chamar de análise de decomposição, onde os movimentos temporais de curto ou médio prazo na taxa de lucro são, por um lado, usados para explicar os principais desenvolvimentos nas economias capitalistas e, por outro, explicados pelos movimentos de seus componentes, devidamente definidos. Uma das questões substantivas centrais que motivam essa vertente da análise de rentabilidade tem sido a possível relação entre a taxa de lucro e as crises estruturais do capitalismo. Uma segunda vertente, mais recente, analisa os movimentos de longo prazo na taxa de lucro e utiliza análises econométricas para abordar empiricamente a lei de Marx sobre a tendência de queda da taxa de lucro (entendida como um fenômeno de longo prazo).

6.1 Análise de Decomposição

A análise de decomposição ocorre em duas modalidades, determinadas pelo período de tempo da análise: uma análise de médio prazo e uma análise de curto prazo.

6.1.1 Análise de Decomposição de Médio Prazo

Quando uma perspectiva de médio prazo é adotada, as flutuações da demanda agregada são abstraídas. Assim, para estudar os fatores determinantes da rentabilidade em uma escala de tempo de médio prazo, uma decomposição da taxa de lucro em participação nos lucros e a relação entre produto e capital é tipicamente utilizada, ou seja:





6.1.2 Análise de Decomposição de Curto Prazo

Quando o interesse é uma análise de rentabilidade de curto prazo, a decomposição da taxa de lucro inclui três termos. Além da tecnologia e da distribuição, a taxa de utilização da capacidade é usada como uma variável para capturar o efeito das flutuações na demanda agregada. Considerando Z como a capacidade de produção, a decomposição em três partes pode ser escrita como:

O primeiro termo à direita, Π/Y, é a participação dos lucros, o segundo termo, Y/Z, é a taxa de utilização da capacidade, e o último termo, Z/K, é a relação capacidade-capital. Assim como na análise de médio prazo, cada um dos três termos da decomposição é, adicionalmente, desagregado em seus componentes reais e nominais para estudos mais detalhados e aprofundados. Seguindo o trabalho pioneiro de Weisskopf (1979), muitos estudiosos têm utilizado e ampliado essa vertente da literatura (por exemplo, Henley, 1987; Bakir e Campbell, 2009; Kotz, 2009; Izquierdo, 2013; Basu e Das, 2015).

6.2 Análise Econométrica da Tendência de Queda da Taxa de Lucro (LTFRP)

A afirmação de Marx no Volume III de *O Capital* de que a taxa de lucro tende a cair com o desenvolvimento capitalista, o que ele chamou de lei da tendência de queda da taxa de lucro (LTFRP), gerou uma enorme literatura nas últimas décadas. Embora a literatura teórica tenha desenvolvido argumentos sofisticados, a literatura empírica sobre esse tema, até muito recentemente, era relativamente pouco desenvolvida. Muitos pesquisadores limitaram-se a utilizar análises exploratórias de dados, como a inspeção visual de gráficos de séries temporais ou o ajuste de linhas de tendência às séries de taxas de lucro, para testar a validade da LTFRP.

Basu e Manolakos (2013) apontaram duas falhas importantes na literatura empírica existente. Primeiro, ela não considerava as propriedades de séries temporais da taxa de lucro. Isso era crucial, pois o fato de a série da taxa de lucro ser estacionária ou não estacionária teria implicações significativas nas análises empíricas de seu comportamento de longo prazo, incluindo a validade da LTFRP. Segundo, o relato de Marx sobre a LTFRP atribuía um papel importante aos fatores contrapostos, mas nenhum dos estudos existentes levava isso em consideração [13]. Basu e Manolakos (2013) argumentaram que a falha em considerar o efeito dos fatores contrapostos na série temporal observada da taxa de lucro invalidaria qualquer teste da LTFRP.

[13]: As únicas exceções foram Feldstein e Summers (1977) e Michl (1988). Embora esses estudos tentassem considerar alguns dos fatores contrapostos, eles não levaram em conta as propriedades de raiz unitária da taxa de lucro (ou de alguns dos fatores contrapostos).

O segundo ponto é importante e merece alguma discussão. No Volume III de *O Capital*, Marx apresentou um argumento simples e poderoso para a tendência de queda da taxa de lucro (LTFRP). A competição capitalista e a luta entre capital e trabalho levam as empresas capitalistas a adotar mudanças técnicas que economizam trabalho. O viés pronunciado da mudança técnica no capitalismo se expressa na mecanização inexorável do processo produtivo. Isso resulta no crescimento contínuo da composição orgânica do capital, que pressiona a taxa de lucro para baixo. Após expor esse argumento para a LTFRP, Marx imediatamente observa a presença de poderosos "fatores contrapostos" nas economias capitalistas que poderiam interromper ou até mesmo reverter a LTFRP: (1) o aumento da intensidade da exploração do trabalho, que poderia elevar a taxa de mais-valia; (2) o barateamento relativo dos elementos do capital constante; (3) o desvio da taxa salarial em relação ao valor da força de trabalho; (4) a existência e o aumento de uma população relativa excedente; e (5) o barateamento dos bens de consumo e de capital por meio das importações. Marx também mencionou o aumento do capital acionário como um sexto fator contraposto. No entanto, a relação entre o capital acionário e a taxa de lucro não é clara e, por isso, podemos abstrair essa variável, seguindo Foley (1986).

O ponto importante é que, em períodos em que os fatores contrapostos eram fracos, a taxa de lucro tendia a cair; já em períodos em que os fatores contrapostos eram fortes, a taxa de lucro deixava de cair e poderia até mesmo subir. O resultado disso é que a série observada da taxa de lucro não apresentaria uma tendência secular de queda. Portanto, nem a inspeção visual de gráficos de séries temporais nem o ajuste de linhas de tendência à série da taxa de lucro eram métodos corretos para testar a validade da LTFRP. Para testar a LTFRP, seria necessário, primeiro, remover o efeito dos fatores contrapostos da série da taxa de lucro e, somente então, investigar a presença de uma tendência de queda no longo prazo. É exatamente isso que uma análise de regressão pode fazer. Assim, Basu e Manolakos (2013) desenvolveram um modelo econométrico para testar a LTFRP, no qual eles regrediram o logaritmo da taxa de lucro sobre uma constante e uma tendência linear de tempo, controlando o efeito dos fatores contrapostos ao incluí-los no modelo como covariáveis adicionais. Após lidarem com a possibilidade de regressão espúria e utilizarem dados da economia dos Estados Unidos para o período de 1948 a 2007, encontraram evidências que apoiam a LTFRP: a taxa de lucro declinou 0,2% ao ano durante o período analisado, após os fatores contrapostos terem sido controlados.

Medição da Utilização da Capacidade - Anwar Shaikh

APÊNDICE 6.6 - Medição da Utilização da Capacidade

I. Medidas Convencionais de Utilização da Capacidade

II. Uma Nova Abordagem para Medir a Utilização da Capacidade

terça-feira, 21 de janeiro de 2025

O Mercado de Ações e o Setor Corporativo: Uma Abordagem Baseada em Lucros - Anwar Shaikh

SHAIKH, Anwar. The Stock Market and the Corporate Cector: a profit-based approach. In: ARESTIS, Philip; PALMA, Gabriel; SAWYER, Malcolm (org.). Markets, Unemployment and Economic Policy: Essays in Honour of Geoff Harcourt. Volume Two. London; New York: Routledge, 1997. p. 389–404.

Resumo

Este artigo demonstra que os movimentos empíricos dos preços das ações podem ser explicados diretamente por fundamentos. Mostra-se que a taxa real de retorno do mercado de ações acompanha de perto a taxa real incremental de lucro do setor corporativo, com ambas apresentando médias e desvios padrão similares. Argumenta-se que essas duas variáveis estão conectadas por fluxos de capital entre os setores por meio de um processo que denominamos "arbitragem turbulenta". Os preços reais das ações acompanham de perto os preços previstos por esse modelo e, ao contrário dos resultados padrão, são menos voláteis do que os preços previstos. A abordagem teórica adotada neste artigo implica que a taxa incremental de lucro é a taxa de retorno exigida para o mercado de ações. A volatilidade observada nos retornos e nos preços do mercado de ações decorre do fato de que a taxa exigida é altamente volátil, sendo influenciada por flutuações cíclicas e outras variações de curto prazo na demanda agregada. Assim, torna-se evidente por que os modelos teóricos convencionais, que tipicamente assumem taxas de retorno exigidas (taxas de desconto) constantes e taxas de crescimento de dividendos constantes, são em grande parte incapazes de explicar os movimentos nos preços das ações. Por outro lado, como a taxa incremental de lucro (líquida de juros) é essencialmente a mudança nos lucros normalizada pelo investimento, as conclusões deste artigo estão alinhadas com a experiência "do mercado", segundo a qual os movimentos nos preços das ações são impulsionados pelas taxas de juros e pelas mudanças nos lucros.

1. Introdução

Este artigo demonstra que o nível e a volatilidade da taxa de retorno do mercado de ações podem ser explicados diretamente por fundamentos – definidos aqui como a taxa incremental de lucro no setor corporativo. Argumenta-se que essas duas taxas estão vinculadas pela mobilidade de capital entre setores. Isso implica, entre outras coisas, que a taxa incremental de lucro real é a taxa de retorno "exigida" para o mercado de ações.

Como princípio geral, retornos mais altos em qualquer setor tendem a acelerar os influxos de capital para ele, enquanto retornos mais baixos tendem a desacelerá-los. Em uma economia competitiva, esse mecanismo fundamental tende a equalizar as taxas de retorno (ajustadas ao risco) entre os investimentos e os setores. Diversos ramos da teoria econômica, como a teoria da firma, a lei do preço único, a teoria financeira e até mesmo o princípio do valor presente, dependem diretamente desse mecanismo [Dybvig e Ross 1992, p. 43; Mueller 1986, p. 8; Diermeier, Ibbotson e Siegel 1984, p. 74].

O fato de que o capital pode se mover entre diversas aplicações implica que a avaliação de qualquer investimento deve sempre ser relativa às alternativas perdidas ao realizá-lo. Este custo de oportunidade fundamenta a noção de uma taxa de retorno de referência ("exigida"), à qual o retorno real de qualquer investimento deve ser comparado a qualquer momento e com a qual tende a se equalizar ao longo do tempo [Ibbotson Associates 1994, pp. 129-130].

Sob certas suposições adicionais (como taxas de retorno exigidas constantes ou mudando lentamente), pode-se derivar o valor presente descontado (PV, na sigla em inglês) padrão e os modelos de desconto de dividendos (fluxo de caixa descontado ou DCF) para precificação de ativos (seção 2). No entanto, esses modelos padrão não apresentam bom desempenho empírico (seção 3). Nossa abordagem, portanto, é um pouco diferente. Partimos da premissa comum de que taxas de retorno ajustadas ao risco tendem a se equalizar entre os setores. Mas, em vez de fazer as suposições adicionais necessárias para chegar aos modelos DCF de precificação de ações, comparamos diretamente a taxa anual de retorno do mercado de ações à taxa incremental de lucro no setor real. Para isso, desenvolvemos uma medida adequada dessa taxa incremental de lucro e mostramos que seus movimentos refletem poderosamente os movimentos da taxa de retorno do mercado de ações (seção 4). Por implicação, os prêmios de risco dos setores são bastante semelhantes. Isso nos permite demonstrar que o mercado de ações é diretamente impulsionado por fundamentos, ou seja, pelos lucros das empresas que emitem ações. Também nos permite avaliar criticamente os modelos DCF padrão.





UMA ABORDAGEM BASEADA EM LUCROS

A noção de que a mobilidade do capital tende a equalizar as taxas de retorno ajustadas ao risco entre setores é fundamental (Cohen et al., 1987: 375). Contudo, do ponto de vista clássico e marxista, a competição cria tanto a tendência de equalizar as taxas de retorno quanto os fatores que diferenciam essas mesmas taxas (como novos produtos, técnicas, etc.). O resultado final é um processo dinâmico e em constante evolução, no qual as taxas de retorno nunca são iguais em um dado momento, mas, em vez disso, flutuam incessantemente umas em torno das outras (Botwinick, 1993: capítulo 5; Mueller, 1986: 8; Mueller, 1990: 1-3). Chamaremos esse processo de “arbitragem turbulenta” para distingui-lo da visão mais convencional de um estado de equilíbrio em que as taxas de retorno são exatamente iguais. A possibilidade de que os fluxos de capital entre o mercado de ações e o setor real igualem suas taxas de retorno levanta uma questão interessante: como isso é possível, dado que investidores individuais (isto é, não capitalistas) desempenham um papel tão grande no mercado de ações? A resposta é que é necessário apenas que os fluxos de capital financeiro adicionem ou subtraiam investimentos suficientes no mercado de ações para regular sua taxa de retorno, em uma escala de tempo relevante. Isso é perfeitamente consistente com modas e tendências, desde que, no final, os fundamentos prevaleçam (Shiller, 1989: 374-6).

Em qualquer processo desse tipo, é amplamente reconhecido que a taxa de retorno sobre novos investimentos é relevante para a mobilidade do capital (Cohen et al., 1987: 375). Ao analisar investimentos industriais, a abordagem tradicional tem sido focar na taxa de retorno ao longo da vida útil do investimento. Essa mesma abordagem é, então, aplicada à análise do mercado de ações, da qual surgem os modelos de desconto de dividendos para precificação de ativos. Tanto para a indústria quanto para o mercado de ações, a taxa de retorno sobre novos investimentos é tradicionalmente definida de duas maneiras: explicitamente como a taxa interna de retorno constante ao longo do tempo (TIR) que desconta os fluxos de caixa para igualar o custo do investimento que os gerou; ou implicitamente pelo excesso de valor presente sobre os custos de investimento a uma taxa de desconto constante e previamente definida [5]. Ambos os métodos têm problemas bem conhecidos (Mueller, 1990: 9). Além disso, como discutido anteriormente, ambos os métodos dependem da suposição empiricamente implausível de uma taxa de desconto real constante (ou pelo menos variando lentamente) [6].

sexta-feira, 3 de janeiro de 2025

Desenvolvimento Econômico Desigual - Erik S. Reinert et al.




RESUMO

Introdução: Desenvolvimento desigual – abordando causas versus tratando sintomas  

Erik S. Reinert e Ingrid Harvold Kvangraven  

PARTE I – FONTES DE DESENVOLVIMENTO DESIGUAL: ORIGEM NATURAL VERSUS POLÍTICAS PÚBLICAS  

1. Desenvolvimento econômico desigual: identificando os pontos cegos da economia mainstream  

Erik S. Reinert  

2. Geografia, desenvolvimento desigual e densidade populacional: tentando uma abordagem não etnocêntrica para o desenvolvimento  

Erik S. Reinert, Salah Chafik e Xuan Zhao  

3. Redirecionando o crescimento: inclusivo, sustentável e orientado à inovação  

Mariana Mazzucato e Carlota Perez  

PARTE II – SUPOSIÇÕES, ABSTRAÇÕES E ABORDAGENS PARA O DESENVOLVIMENTO DESIGUAL

4. Estados alterados: sonhos cartesianos e ricardianos  

Erik S. Reinert, Monica Di Fiore, Andrea Saltelli e Jerome R. Ravetz  

5. Gênero e desenvolvimento desigual

Lyn Ossome  

6. Teoria da dependência: forças, fraquezas e sua relevância hoje  

Ingrid Harvold Kvangraven  

7. A necessidade de centralizar o imperialismo nos estudos sobre desenvolvimento desigual  

Ingrid Harvold Kvangraven  

8. Imperialismo: uma nota sobre os tratados desiguais da China e do Japão modernos  

Xuan Zhao  

PARTE III – ENTENDENDO OS MECANISMOS QUE CRIAM E PREVINEM A DESIGUALDADE

9. Fisiocracia, guilhotinas e antissemitismo? A economia imitou o Iluminismo errado?  

Andrea Saltelli e Erik S. Reinert  

10. Retrocesso tecnológico e pobreza persistente  

Sylvi B. Endresen  

PARTE IV – QUANDO NAÇÕES E SISTEMAS ENFRAQUECEM E COLAPSAM

11. Quando nações colapsam: uma nota sobre On the Decline of States de Jacob Bielfeld (1760)  

Erik S. Reinert  

12. Livre comércio com os antigos países do COMECON como troca desigual  

Marta Kuc-Czarnecka, Andrea Saltelli, Magdalena Olczyk e Erik S. Reinert  

13. Escapando da armadilha da pobreza na China: a coevolução da diversidade na propriedade e no desenvolvimento econômico  

Ting Xu  

14. Experiências recentes de políticas econômicas bem-sucedidas: o caso do Uzbequistão  

Vladimir Popov  

PARTE V – FINANÇAS VERSUS A ECONOMIA REAL

15. Desenvolvimento desigual, capitalismo financeiro e subordinação  

Bruno Bonizzi, Annina Kaltenbrunner e Jeff Powell  

16. Crescimento desigual e a moeda única: o paradoxo da política fiscal  

Jan Kregel  

PARTE VI – ECOLOGIA

17. Identificando a troca ecológica desigual no sistema mundial: implicações para o desenvolvimento  

Alf Hornborg  

Conclusão: quais são as lições importantes da história? 

Erik S. Reinert e Ingrid Harvold Kvangraven