1. Resumo
Este artigo apresenta uma decomposição da taxa de lucro para a indústria de manufatura brasileira no período de 1949 a 1985, com base em Foley (1986). Primeiramente, foi calculada a taxa de mais-valia, a composição do capital, a taxa de rotação do capital, a margem de lucro e a taxa de lucro. O comportamento dessas variáveis na indústria de manufatura brasileira durante o período de 1949 a 1985 corresponde às previsões de Marx. Em segundo lugar, o crescimento da indústria de manufatura brasileira é descrito com referência ao comportamento das categorias mencionadas acima, em particular, é analisada a crise dos anos 1970. Ao contrário dos economistas estruturalistas que explicam a crise brasileira naquele momento devido a problemas de demanda, este artigo aponta que foi resultado do aumento da composição orgânica do capital, de acordo com o mecanismo marxiano tradicional da queda da taxa de lucro.
O fim da chamada Era de Ouro nos anos 1970 impulsionou uma série de pesquisas empíricas dentro da tradição marxista. No entanto, essas pesquisas foram realizadas principalmente para os países desenvolvidos, sendo escassos os estudos sobre os países em desenvolvimento. Para a economia brasileira, Rosinger (1988) é a única tentativa de calcular a taxa de mais-valia, a composição orgânica do capital e a taxa de lucro. No entanto, os anos considerados (1970 e 1975) são insuficientes para identificar qualquer tendência de comportamento nas variáveis.
Este artigo investiga a evolução da indústria de manufatura brasileira no período de 1949 a 1985 a partir de uma perspectiva marxista. Inicialmente, tem como objetivo estimar a taxa de lucro e seus componentes básicos, como a taxa de mais-valia, a composição do capital e a taxa de rotação do capital, na indústria de manufatura brasileira para os anos de 1949 e 1959, bem como para o período de 1970 a 1985. Além disso, é calculado o markup. Essas variáveis são calculadas de acordo com os capítulos 3 e 6 de Foley (1986).
Em segundo lugar, o crescimento da indústria de manufatura brasileira é descrito com base no comportamento das categorias mencionadas anteriormente. O objetivo é determinar a fonte de variação na taxa de lucro, decompondo tais modificações em mudanças na taxa de mais-valia, na composição do capital - cuja soma nos dá a variação no markup - e na taxa de rotação do capital. Por trás desse objetivo está a concepção de que "a taxa de lucro é crucial para o funcionamento das economias capitalistas" (Duménil e Lévy, 1993, p. xi).
Essa decomposição permite investigar a concepção de que a crise brasileira nos anos 1970 foi causada por problemas de demanda. Essa interpretação fornecida pelos economistas estruturalistas explica a crise brasileira naquele momento devido à desproporcionalidade de crescimento entre os setores industriais e o setor agrícola (Serra, 1982) e "problemas de realização dinâmica" no setor de bens duráveis de consumo (Tavares e Belluzo, 1982, p. 130). Essa interpretação é confrontada com a explicação marxista mais tradicional das crises, baseada na tendência da taxa de lucro a cair devido ao aumento da composição orgânica do capital.
Este artigo está organizado em três seções. Na seção 1, é fornecida uma descrição concisa da produção manufatureira. Os objetivos são familiarizar o leitor com a evolução da economia brasileira no período de estudo e estabelecer uma periodização do crescimento da indústria de manufatura brasileira. Na seção 2, é apresentada a metodologia empregada para calcular e os resultados de cada categoria marxista. Na última seção, é apresentada uma relação entre a evolução da indústria de manufatura brasileira e a taxa de lucro por meio de uma decomposição de longo prazo e de pico a pico. A apresentação da fonte de dados e a discussão da consistência empírica das estimativas são relegadas ao Apêndice.
O Crescimento da Indústria de Manufatura Brasileira: 1949-1985
A economia brasileira no período de 1949 a 1985 expandiu-se com uma alta taxa de crescimento por meio de um processo de industrialização por substituição de importações (ISI). O Produto Interno Bruto (PIB) aumentou em termos reais a uma taxa composta anual de 6,5%. Esse crescimento foi liderado pelo setor de manufatura, cujo valor adicionado bruto expandiu a uma taxa de 7,8% ao ano. O setor de manufatura foi o principal determinante tanto da evolução de longo prazo quanto da evolução cíclica do PIB.
O caminho de crescimento de longo prazo foi caracterizado por dois períodos distintos: a era dourada da ISI entre 1949 e 1973 e a crise e o fim da ISI entre 1973 e 1985. Durante a era dourada da ISI, a renda per capita real triplicou e a produtividade do trabalho na indústria de manufatura multiplicou por quatro. Enquanto a participação da agricultura no valor adicionado caiu de 24,1% para 12,6%, a indústria aumentou de 25,4% para 41,9% e a manufatura de 19,3% para 33%.
O PIB expandiu-se a um ritmo composto anual de 7,5% a preços de mercado constantes, e o valor adicionado bruto da manufatura a 9,9%. O comércio exterior diminuiu sua participação no PIB de 23,4% para 15,3%.
O comportamento cíclico da indústria de manufatura foi caracterizado por três momentos. A década de 1950 foi marcada por uma rápida industrialização com expansão de bens duráveis de consumo e bens de capital, especialmente durante o "Plano de Metas" (Programa de Metas, 1956-1960). A década de 1960 foi marcada por estagnação, mas com mudanças políticas e institucionais. Essas mudanças tiveram seu ápice econômico nos anos de 1968 a 1973. O chamado Milagre Econômico, como é conhecido esse período, foi marcado por uma impressionante taxa de crescimento composta anual de 14% no setor de manufatura.
No entanto, após 1973, com a crise capitalista internacional e os limites internos da ISI, houve uma deterioração no desempenho de crescimento da indústria de manufatura. Entre 1973 e 1985, o valor adicionado bruto da manufatura expandiu a uma taxa de 3,7% ao ano, o PIB real cresceu a 4,9% ao ano e a produtividade do trabalho permaneceu basicamente constante. Em termos de participação no valor adicionado, não houve mudanças significativas na participação da agricultura e da indústria. O comércio exterior aumentou sua participação no PIB de 15,3% para 22,6%.
Em termos cíclicos, a crise e o fim da ISI também foram caracterizados por três momentos. Primeiro, entre 1973 e 1980, os bens intermediários passaram por um processo de substituição de importações com o "II Plano Nacional de Desenvolvimento" (II Plano Nacional de Desenvolvimento, 1974-1978). Essa foi a resposta da ditadura militar à primeira crise do petróleo. Apesar da crise, o setor manufatureiro brasileiro cresceu a uma taxa de 6,8% ao ano.
Em segundo lugar, entre 1980 e 1983, o valor adicionado bruto da manufatura diminuiu a uma taxa composta anual de 5,6%. O início dos anos 1980 marcou o fim da ISI. Nesse momento, a estrutura industrial brasileira era semelhante à dos países capitalistas avançados. No entanto, devido a problemas externos decorrentes do segundo choque do petróleo e do aumento da taxa de juros internacional, bem como problemas econômicos internos, o setor manufatureiro teve sua pior recessão no período de 1949 a 1985. Por outro lado, no período de 1983 a 1985, estimulado pelo crescimento das exportações, o setor manufatureiro expandiu a uma taxa de 7,2% ao ano. Esse desempenho foi devido ao baixo nível de utilização da capacidade no setor manufatureiro em 1983.
A Tabela 1 resume os parágrafos acima. É uma periodização da evolução da indústria de manufatura brasileira entre 1949 e 1985.
Nenhum comentário:
Postar um comentário